16 mayo, 2018

Com 260 mil pessoas, feira do MST teve samba e rumo politico

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Seus idealizadores eram homens da Sociedade Rural Brasileira, nascida para defInaugurado em 1929, o ano do crack da bolsa de Nova York e do anoitecer da República Velha, que no ano seguinte seria derrubada por Getúlio, o Parque nasceu como um local de ares elitistas, conservados até hoje numa arquitetura de estilo normando, própria para países de clima bem mais frio do que o nosso.ender os interesses da velha elite do café e que, mesmo dedicando-se a um leque mais variado de produtos, nunca abandonou a missão orginal, inclusive nos na Constituinte de 1988.
Exatamente 100 anos depois da abolição da escravatura, a SRB foi uma das forças mais articuladas de Brasília para um combate sem tréguas à reforma agrária. Como esta é, justamente, a razão de ser do MST, havia uma obvia ironia no evento desses quatro dias, quase um aviso de que algumas mudanças históricas podem ser adiadas e retardadas, mas dificilmente serão impedidas.
Formado há 34 anos, hoje uma das principais organizações engajadas na defesa dos direitos do presidente Lula, a bandeira do MST estava em toda parte do Parque.Inclusive numa área reservada, onde personalidades convidadas e artistas -- foram mais de 350 nos quatros dias -eram recebidos antes e depois das respectivas apresentações. Na noite de domingo, o coordenador do MST e seu líder histórico, João Pedro Stedile, se dedicava a um afazer menos conhecido. A frente de três grandes panelões, Stedile comandava o preparo de um arroz carreteiro que, posso testemunhar, tinha um sabor grandioso como poucas vezes se viu. "É uma velha receita de família", disse ele ao 247, no momento em que a iguaria -- o nome é adequado, sim senhor -- era servida aos integrantes da Unidos do Tuiuti, campeã moral, artística, política, o que mais você quiser, do carnaval 2018.


"Estamos abrindo um espaço de diálogo com a população de São Paulo", afirma João Paulo Rodrigues, coordenador nacional do MST.


Quem frequentou o parque Água Branca no final da década de 1950, início de 1960, guardou a lembrança de um ambiente público, aberto a quem quisesse entrar, mas nem tanto. Ali era o local de encontro não para os homens e mulheres simples da cidade, muito menos para o lazer trabalhadores rurais, mas um ambiente sob medida para grandes fazendeiros, seus descendentes e protegidos, a começar por sua área central -- um campo de areia, já usado para aulas de equitação e que no passado também serviu para concurso de animais de raça.

Mais tarde, animado pelas ondas universais do ambientalismo, no Parque se formou um ponto de encontro para a venda de produtos orgânicos e uma militância aguerrida, que incluiu a organização de protestos contra uma reforma ensaiada pela primeira dama de um dos inúmeros governadores de São Paulo que o PSDB já possuiu.

Nos quatro dias da Feira da Reforma Agrária, a área de equitação virou o coração da festa. Foi ali que, na noite de domingo, Martinho da Vila se apresentou. Militante político desde os tempos da ditadura militar, onze dias antes Martinho inscreveu seu nome na lista de personalidades impedidas de visitar o presidente Lula, encarcerado em Curitiba. Em São Paulo, ele empolgou a platéia quando cantou o clássico "Pequeno burguês", uma denúncia do ensino privado atualizada apelos cortes de Temer-Meirelles no crédito educativo, e provocou uma vibração especial quando puxou o coro "Lula Livre".

Havia música e dança em outros lugares, também. À beira de um lago de águas escuras que serve de criadouro de carpas imensas, era possível participar de uma roda aberta de baião, onde todos dançavam até cansar. A poucos metros, um trio de saxofone, pandeiro e violão, entoava chorinhos, com delicadeza e um visível esforço para não sair do tom. Quando ocorreu um pequeno deslize, um dos músicos lamentou, bem-humorado, com a certeza de que todos estavam entre amigos: "eu disse que precisávamos ter ensaiado antes".

Tenho certeza de que, um dia, cenas que vi ontem no Parque Agua Branca estarão num filme brasileiro sobre esses dias difíceis e perigosos que o país atravessa, quando tudo parece perdido mas onde muitas pessoas não desistiram de tentar ser felizes. Quero ter a chance de ouvir de novo a conversa de duas irmãs que, no 1 de maio, tomaram o ônibus noturno para uma viagem de seis horas até Curitiba, aonde explodiram os pulmões de tanto gritar "Lula Livre!" em frente a sede da Polícia Federal. Depois, passaram uma noite na casa de uma moradora local que ofereceu hospedagem e voltaram a São Paulo com a certeza de que tinham acompanhado um momento da história de suas vidas que nunca mais vai se repetir. "Todo mundo deveria fazer isso," dizia uma delas, sentada numa mesinha perto da roda de baião. "Todo mundo". Por que?, pergunto. "Quem não entendeu o que é o Lula não entendeu nada. Nada. É isso que estou explicando para meu filho. Ele tem 17 anos".


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